domingo, 24 de maio de 2009

Acerca dos 271 anos da experiência religiosa do coração aquecido de João Wesley, o fundador do movimento metodista



Por Pr. Ronan Boechat de Amorim
Ao falarmos da experiência do Coração aquecido de João Wesley naquele 24 de maio de 1738 naturalmente nos recordamos do princípio do metodismo na Inglaterra naquele já distante século XVIII.

E nos lembramos da degradação moral, social, política e religiosa em que vivia a Inglaterra de então. E como em meio aquela situação uma família se destacava em levar à sério a religião, a espiritualidade e o desejo de fidelidade a Deus. Suzana Wesley, aquela mãe e cristã tão vigorosa, ética, sensível e cheia de fibra, o quanto ela foi perseverante em educar seus filhos no temor do Senhor, distinguindo-se do que era “normal em sua época”. Vemos que João Wesley, apesar de todo ensino recebido zelosa e apaixonadamente por sua mãe Suzana, começa uma busca pessoal pela sua própria experiência com Deus. Não queria ser um cristão cujas experiências com Deus fossem limitadas às vividas e recebidas da senhora sua mãe. Ele buscava intensamente ter a sua experiência pessoal e de fé com Deus.

Foi em busca dessa experiência de fé que aceitou ir como missionário na então colônia inglesa na América do Norte, de onde volta algum tempo depois profundamente humilhado, fugindo de um processo colocado na justiça contra ele por supostas práticas pastorais inadequadas.

Em Londres, procura relacionar-se com cristãos alemães chamados de “moravianos”, que eram liderados por um conde chamado Zinzendorf. Ele ficara impressionado com a fé dos moravianos durante sua viagem de ida para a Geórgia. Quando o navio era sacudido de um lado para o outro, um grupo moraviano seguia calmo e confiante. “Nós confiamos em Deus e nossas vidas estão salvas em suas mãos”, diriam mais tarde. Em Londres torna-se amigo de um pregador moraviano que estava naquela cidade preparando-se para seguir viagem para a América. Wesley e Pedro Bolher conversam por vários dias sobre a fé, a doutrina, a salvação, a certeza de ser salvo por Deus, etc... Wesley percebe que criam exatamente na mesma doutrina, mas que lhe faltava sem dúvida, aquilo que ele se ressentia de não ter tido ainda: uma forte experiência com Deus. O que acontece numa pequena reunião dos moravianos na noite de 24 de maio de 1738 quando o pregador lia um comentário escrito quase 200 anos antes por Martinho Lutero sobre o livro de Romanos.

Ele que confessa mais tarde em seu diário ter ido à tal reunião praticamente sem nenhuma vontade; mas que por volta das 20:45h quando o pregador falava sobre as mudanças realizadas por Deus na vida dos salvos, ele sentiu seu coração estranhamente aquecido (na verdade, sentiu seu coração estranhamente abrasado, ardente) pelo poder de Deus e sentiu que seus pecados estavam perdoados, que ele confiava em Deus... um grande peso saiu de sobre seus ombros e ele deixou de ser apenas um servo, passando a experimentar a maravilhosa experiência de ser filho de Deus.

Daquele 24 de maio em diante João Wesley nunca mais foi a mesma pessoa ou o mesmo pregador. Começou um movimento de discipulado de crentes dentro da Igreja Anglicana, que visava vida de oração, estudo da Palavra de Deus, desejo por santidade e dedicação à evangelização e à missões. Ao morrer em 1792, aos 89 anos de idade, calcula-se que havia 70 mil metodistas na Grã-Bretanha (Inglaterra, Escócia e Irlanda) e que pelo menos outros 70 mil já haviam morrido durante sua vida tão longeva.
Apesar de ser perseguido pelas autoridades da Igreja Anglicana por causa de seu “entusiasmo” (fervor), deixando-o não apenas sem a designação para uma paróquia, mas proibindo-o de pregar em qualquer igreja anglicana, Wesley e todos os metodistas enquanto ele viveu não deixaram de ser nem anglicanos nem metodistas. O metodismo era um movimento de santidade e evangelização dentro da Igreja Anglicana. Quando proibido de pregar em templos anglicanos, Wesley disse: “O mundo é a minha paróquia”. Sobre o porquê Deus havia levantado os metodistas ele afirmou: “Para reformar a nação, particularmente a igreja; e para espalhar a santidade bíblica por toda a terra”. Sua grande prioridade: “Nada a fazer senão salvar almas”.

Seu “entusiasmo” não foi nem irracional nem alienante. Pois levou Wesley a compreender que além de salvar a alma da pessoa do inferno, era necessário também salvar a vida das mesmas antes da morte, tirando-as de sob o poder da pobreza, do analfabetismo, do trabalho escravo, da injustiça e de todo tipo de valores e práticas que não tivessem em conformidade com a vontade de Deus. O avivamento de Wesley não era apenas no culto, mas sobretudo no dia a dia. E sua teologia do que podemos chamar hoje de “salvação integral” levou-o também a lutar contra a escravidão, os vícios, as leis e sistema prisional desumano da Inglaterra de então.

Olhando para a história desse homem que teve seu coração “estranhamente aquecido” (coração fervente) pelo poder do Espírito Santo, não temos como não reconhecer que foi um homem tremendamente usado por Deus e que ele é um testemunho explícito e vivo de que:

1 – NÃO PODEMOS NOS SATISFAZER COM EXPERIÊNCIAS ALHEIAS E COM VIDA ESPIRITUAL MEDÍOCRE – Não devemos nos satisfazer com aquilo que generosa e amorosamente recebemos de nossos pais e de nossa Igreja. É preciso buscar nossa própria experiência de fé com Deus. Não podemos ser cristãos alimentados apenas pela fé de nossos pais e pela tradição dos que nos antecederam nessa fé. É fundamental que tenhamos nossa própria experiência de fé (e pessoal) com Deus. Deus tem mais para nós do que aquilo que nossos pais podem compartilhar conosco, repassar para nós... por mais leais a Deus e à tarefa do testemunho e do ensino cristão que eles sejam.
Não podemos nos satisfazer com relações superficiais, medíocres, ritualistas e mecânicas com Deus. É necessário que o Espírito de Deus testifique em nosso próprio coração que somos filhos e filhas de Deus. E a partir daí construir uma vida de intimidade e de experiências pessoais contínuas com o Deus vivo e presente.

2 – NÃO DEVEMOS VIVER DE ACORDO COM O MEIO SOCIAL E CULTURAL, MAS DE ACORDO COM A VONTADE DE DEUS – O meio social, político, cultural, eclesiástico e teológico com certeza influem poderosamente no tipo de pessoas que somos ou seremos, nos valores que temos ou teremos e também no tipo de espiritualidade (relação com Deus) que temos. Mas nossa maior referência e influência têm de ser o Evangelho e o Espírito Santo de Deus.

O meio ambiente, cultural e social e religioso forma, deforma, conforma, reforma, formata, etc, as pessoas; mas pessoas podem questionar a formação, superar a conformação e experimentarem reforma e transformação. Particularmente se foram despertadas para a situação em que estão e encorajadas a uma mudança significativa através e por causa do amor de Deus.

Pessoas genuinamente cristãs têm o Evangelho de Jesus como “lâmpada para os pés e luz para o caminho” (Sl 119:105). De modo que têm por natureza o discernimento que nos faz sermos críticos diante das coisas, das tradições, das inovações, das repressões, dos rolos compressores dos modismos de qualquer espécie, inclusive, os modismos teológicos.

Deus tem o poder de mudar as pessoas e o meio cultural onde as pessoas vivem. Para provocar mudanças existe também o testemunho pessoal, a evangelização (que deve ser integral curando o caráter da pessoa, seus relacionamentos e os valores e estruturas da comunidade onde vive) e, sobretudo o poder do Espírito Santo que convence do pecado, guia à verdade e faz tudo novo. Os grandes e genuínos avivamentos, inclusive, têm essa finalidade: mudam as pessoas e enchem a história humana de mais graça de Deus.

3 – PEQUENOS ENCONTROS E PESSOAS SIMPLES TAMBÉM PODEM PROMOVER GRANDES MUDANÇAS – Pessoas simples, como o missionário moraviano Pedro Bolher, podem ser tremendos canais de graça e instrumentos do agir de Deus de Deus, das mudanças de Deus, das operações de Deus em pessoas, nas histórias dessas pessoas e na história da comunidade. Wesley foi, digamos, o estopim que foi aceso através da instrumentalidade de Pedro Bolher pelo “fogo” do Espírito Santo. Depois de um tempo em Londres ponde esperava para ir como missionário nas Américas não se ouviu mais esse nome. Mas assim como o muito sem Deus é sempre pouco, o pouco com Ele muito se faz; é sempre o suficiente.

4 – QUE O CAIR É DO HOMEM, MAS QUE A SALVAÇÃO PERTENCE AO SENHOR – João Wesley, um homem que confiava em seus próprios méritos, na sua sabedoria e conhecimentos, na segurança dos ritos e do tradicionalismo, foi levado por Deus à colônia inglesa na Geórgia e ali foi quebrado como um vaso nas mãos do oleiro. Foi reduzido a alguém que não tinha mais como confiar em si mesmo. Reconheceu que precisava desesperadamente do socorro do Senhor e quando clamou este aflito, Deus o ouviu, o ergueu e o tornou um instrumento de graça e salvação confiável. Não porque era grande, mas porque sua grandeza estava em depender e em obedecer a Deus em todas as coisas.

5 – PESSOAS PODEM LIDERAR PESSOAS E AJUDÁ-LAS A SEREM TRASFORMADAS POR DEUS – João Wesley nunca teve o poder de transformar as pessoas, mas nas mãos de Deus foi um grande líder que levou pessoas a colocarem suas vidas e a fé nas mãos do único e suficiente Salvador, o Senhor Jesus.

Um homem sozinho não pode mudar ninguém (ao menos para melhor!!), não pode mudar um país inteiro, não pode mudar o mundo, transformando-o num lugar melhor e mais justo para todos, mas pode, sob o poder de Deus, vislumbrar e profetizar mudanças, proclamar e promover mudanças, animar e reunir pessoas que desejam mudanças e liderar pessoas para que mudanças de fato aconteçam.

6 – QUE A IGREJA PODE SER O LUGAR DA AUSÊNCIA DE DEUS - A Igreja (a vida das pessoas crentes, o culto, os ritos, a religião cristã, etc) pode transformar-se num lugar difícil de encontrar o Deus vivo, tal como aconteceu no tempo de Jesus com o templo de Jerusalém e seus religiosos e tal como aconteceu no tempo de João Wesley, onde, segundo estudiosos, se alguém se convertesse de seus pecados os mais surpresos seriam os próprios pregadores.

Graças a Deus porque ele não desiste de seu povo, de sua igreja e que o fermento do Reino, tal como aconteceu com João Wesley e seus companheiros metodistas, leveda toda a “massa”, todo o corpo, sendo luz que vence as trevas e sal da terra. As misericórdias do Senhor são a causa de não sermos consumidos. Aleluia!

7 – NADA QUE HOJE É GRANDE COMEÇOU GRANDE E TUDO QUE É GRANDE COMEÇOU PEQUENO – Foi assim como movimento dos metodistas e posteriormente com a Igreja Metodista. Começou com um, depois dois, depois dez, depois cem. Mas graças a Deus por aqueles que viram quando nada ainda havia para ver, a não ser através da fé. “Paulo plantou, Apolo regou, mas é Deus quem dá o crescimento”. Aleluia!

8 – NÃO TEMER AS ESTRUTURAS, AS PERSEGUIÇÕES E A PERDA DE PRIVILÉGIOS – João Wesley, de posse da tarefa que Deus lhe deu, enfrentou as tradições doentias, o clero corrompido e sem visão missionária, a cultura da frouxidão ética, a antipatia dos governantes, a perda de uma designação para uma igreja local e até mesmo a humilhação de ser proibido de pregar na igreja da qual era pastor, que seu pai, avôs e bisavôs eram pastores. Ele certamente sofreu, mas preferiu tomar sobre si a cruz de Cristo, não se deixou apequenar diante dos poderes das estruturas eclesiásticas, não se deixou corromper pelas dádivas de uma teologia e uma ação pastoral e missionária domesticada, mas se ressentiu de perder o papel de comensal na mesa das autoridades e os privilégios daí advindos. Ele preferiu ser fiel a Deus, ao seu chamado, à sua fé e à sua consciência. Como Daniel, ele preferiu estar com Deus na cova dos leões do que estar sem Ele na Mesa do rei e nas louvações do Palácio real.

9 – TER UMA AUTORIDADE QUE NÃO ABRE NÃO DO PODER, MAS EXERCER O PODER E A AUTORIDADE NO TEMOR DO SENHOR, COMO DESPENSEIRO DE DEUS E SERVO DOS DEMAIS E COMO QUEM ESTÁ PRONTO PAR AOUVIR E MUDAR - Depois que teve sua experiência com Deus naquele 24 de maio Wesley tornou-se crescentemente uma referência e uma autoridade espiritual e pastoral em seu país. Mas foi um homem que ouvia e que mudava de opinião, mesmo que isso doesse tanto quanto ter de arrancar o próprio fígado. Foi assim com a pregação de leigos, com a pregação de mulheres, com a ordenação de pregadores para ministrar a Ceia aos metodistas dos EUA quando não havia lá sacerdotes anglicanos para fazê-lo... Também aceitou a autonomia dos metodistas norte-americanos em relação à Igreja Anglicana... era contra tudo isso, mas Deus, através de sua mãe Suzana, de seu amigo Maxfield, e de outros próximos, o quebrava e remodelava sempre que necessário.

10 – É PRECISO CONTINUAR, SENDO CRIATIVO E REMINDO O TEMPO – João Wesley nunca se satisfez com o trabalho feito e os resultados obtidos. Não podia descansar enquanto houvesse pessoas a serem alcançadas e almas a serem aliviadas, perdoadas e salvas. Morreu aos 88 anos de idade, trabalhando, mesmo depois de ter exercido um ministério pastoral e evangelístico no qual pregou mais de 40 mil vezes, escrito mais de 30 livros, visitado missionariamente a Irlanda 11 vezes e a Escócia 22 vezes, viajado a cavalo mais de 4.500 milhas por ano até os seus 60 anos de idade (totalizando mais de 375.000 quilômetros), pregado e visitado... Wesley e os primeiros metodistas apoiaram a reforma do ensino que era fraco e para apenas alguns poucos privilegiados; criaram escolas para os pobres e casas de acolhida para as viúvas e órfãos pobres; apoiaram as mudanças nas leis e a reforma das prisões; lutou pela libertação dos escravos; contra o trabalho das crianças nas minas de carvão; e por uma reforma ampla e geral das leis e costumes da decaída Inglaterra do Século XVIII.

No leito, bem pouco antes de morrer escreveu ao primeiro ministro inglês de então, Wilbeforce, igualmente um metodista, para que não cessasse de lutar contra a escravidão, o mais vil pecado e vergonha sobre a face da terra. E ao invés de vangloriar-se do que fez e do legado que deixava, apenas disse: “O melhor de tudo é que Deus está conosco”.

Ainda sobre o legado que deixava, sentenciou: “Não tenho medo que o Metodismo deixe de existir. Tenho medo que ele se torne insípido”.

João Wesley, foi profundamente impactado pela sua experiência religiosa do 24 de maio de 1738, mas nunca tornou-se prisioneiro dela. Ou melhor, nunca foi homem de apenas uma única experiência com Deus. Na medida em que os anos passam daquele 1938, cada vez ele fala menos daquela experiência. Tinha outras experiências a viver e a testificar.

Como dois séculos mais tarde diria o Bispo Metodista Francis Ensley sobre aquele 24 de maio, a experiência do coração aquecido acontecida na rua Aldersgate “não livrou Wesley da luxúria, da bebedeira ou da criminalidade. Não representa a conversão aos preceitos de Cristo, ou um retorno da indiferença religiosa. Aldersgate marca uma onda contrária aos inimigos espirituais que o flagelavam. Um deles era a concepção legalista da religião que ele professava. (...) O outro inimigo espiritual foi a indiferença emocional. (...) Sua religião era antes um peso do que algo que trouxesse alívio. (...) E para uma coisa ela o inflamou: para a tarefa evangelística”.
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quinta-feira, 21 de maio de 2009

Cultura Gospel: Fruto da pós–modernidade



Por : Antônio Carlos Soares dos Santos*
Cada vez mais me convenço de que estamos vivendo um tempo de grandes perdas, de grandes “desvios”, de sepultamento das raízes do mais puro cristianismo. E o algoz tem um nome: Cultura Gospel.
Não é protestantismo, nem mesmo pentecostalismo, mas é um fruto oriundo da tal pós-modernidade. Uma das características dessa “dita-cuja” pós-modernidade é justamente a ojeriza ao passado, às tradições e tudo que possa indicar algo que um dia chamamos de IDENTIDADE.
Não entendo muito bem o que seja essa tal pós modernidade...mas uma coisa digo..não é coisa boa não...mas vamos recorrer a especialistas. O sociólogo polonês Zygmunt Bauman diz que pós modernidade é “uma realidade ambígua, multiforme, na qual, como na clássica expressão marxiana, tudo o que é sólido se desmancha no ar”. Já o filosófo francês Gilles Lipovetsky declara ser “uma exarcebação de certas características das sociedades modernas, tais como o individualismo, o consumismo, a ética hedonista, a fragmentação do tempo e do espaço”.
Agora pergunto: nosso adorável mundo gospel não é pós moderno?
Com toda sua busca individualista, com seu capitalismo religioso, com as estatística de mercado, suas estratégias de Marketing... A verdade é que o pós modernismo (leia-se: cultura gospel) esvaziou o cristianismo e nós ainda batemos palmas para isso. Trocamos a seriedade e serenidade pelo êxtase momentâneo do sucesso a qualquer preço.
O Prof. Isaías Lobão Pereira Júnior em seu artigo “A Igreja Brasileira na Pós-modernidade” faz a seguinte declaração: “Na Igreja, o que antes era convicção, hoje é opção. Os mandamentos divinos passaram a ser sugestões divinas. A igreja é orientada por aquilo que dá certo e não por aquilo que é certo”.
Que grande e triste verdade! Podemos perceber cada vez mais essa realidade quando nos deparamos com algumas mensagens que exaltam tanto a busca de poder e os dons individuais e nada dizem a respeito da comunhão partilhada, da necessidade do arrependimento, do caráter de Jesus, da compaixão com os injustiçados em uma sociedade corrompida, cruel e impune.
Vivemos tempos em que a Bíblia não é mais a nossa única regra de fé, pois, as experiências pessoais acabam por suplantar o conceito bíblico de Igreja, suas doutrinas e orientações mais essenciais. É lamentável vermos nossa amada Igreja Metodista, de tantas histórias e História, de tanta tradição, se perder em meio a uma salada “gospel” de consumismo mercadológico. E todos sabem que os olhos do mercado não enxergam o individuo e sim a multidão.
Vivemos uma contradição eclesiológica, pois adotamos o discipulado como estilo de vida, mas a prática é cada vez mais de agrupamento de pessoas sem rosto e sem identidade. E não importa os meios que se usa para alcançar esse “agrupamento”, o importante é que o “número” aumente!
Deus é o produto...os fiéis, os consumidores...Deus é encontrado com várias faces de acordo com o gosto e a tendência...Tem o Deus dos ricos, o Deus dos “guerreiros”, o Deus curandeiro, o Deus-Gênio da Lâmpada...Onde antes era “Senhor, seja feita a Tua vontade” hoje é “ eu reinvidico, eu exijo, eu determino...”
Uma pregação triunfalista, ufanista...triste, dolorida para quem antes buscava a Igreja para encontrar uma palavra de consolo, carinho e até mesmo de exortação e não uma chamada para sucesso continuo e ininterrupto. Não existe mais aquela sede pelo conhecimento a Deus, não é mais o que quero conhecer, mas o que eu sinto é o que importa, se a Palavra não me agradou eu busco uma que me agrade e com isso o corpo pastoral passa não mais a aplicar o que a Igreja necessita, mas sim o que o povo quer.
Jazie Guerreiro explana muito bem isso ao dizer “Na cultura pós-moderna o religioso se expressa com um forte predomínio da experiência sobre a razão e sobre a própria explicação da fé”. Enquanto o espírito ecumênico é duramente criticado e até visto como jocoso, o sincretismo religioso vai ganhando espaço nas Igrejas e alimentando a superstição popular. Quando vemos que o símbolo se torna maior que o significado, alguma coisa está muito errada!
Ao que parece, já não sabemos mais como o autor de I Pedro nos convida a “estarmos sempre preparados para responder a qualquer pessoa que nos pedir a razão de nossa esperança” (I Pedro 3.15), talvez por considerarmos que Rick Warren com sua “obra prima” Uma igreja com propósitos tenha mais a dizer ao povo de Deus do que a própria tradição bíblica e histórica da Igreja.
Como pastor metodista, de tradição Wesleyana, me preocupo muito...hoje estou vendo que não sou festeiro, que não sou alegre o tempo todo, que tenho momentos de tristeza, de solidão...por isso compreendo que não posso prometer a Igreja nada além daquilo que Deus revela na Bíblia...Felizmente, ou infelizmente, para alguns, levo meu pastorado muito a sério.
Em meio a tantas heresias ditas à vontade nos púlpitos, televisão e rádios, quero citar um “herege” abençoado por Deus e lúcido: “Já não espero que uma relação com Deus me blinde de percalços. Não acredito, e nem quero, que Deus me revista com uma carcaça impenetrável. Acho um despautério prometer, em meio a tanto sofrimento, que uma vida obediente e pura gere segurança contra doenças, acidentes, violência”. (Pr. Ricardo Gondim). Hoje vivemos uma pós modernidade, “uma mistura de ilusão com esperança”[1], para que no fim de tudo, Deus venha a restaurar a ordem e confirmar os valores de seu Reino.
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* Antônio Carlos Soares dos Santos é pastor Metodista
[1] Gondim, Ricardo: Repensando a fé.
Fonte - http://metodistaecumenico.blogspot.com/ - 5 maio de 2009

domingo, 17 de maio de 2009

Manifesto do Movimento Metodista Confessante sobre a Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos de 2009



No livro Um só Senhor, uma só Igreja publicado no Brasil em 1964 o Rev. Metodista Dr. John Robert Nelson pergunta:
"Por que tanto interesse hoje pela unidade cristã? Se o problema da unidade fosse ignorado, a vida seria muito mais fácil para a maior parte dos cristãos em todo o mundo. O fato de que diferenças doutrinárias impedem todos os membros da família de Cristo de receber a Sua Ceia na mesma mesa, não seria causa de angústia de espírito de forma alguma; a competição aberta de igrejas cristãs pregando o mesmo Evangelho da mesma Bíblia na mesma vila para confusão dos mesmos povos não-cristãos, não seria causa de escândalo; cada pequeno grupo de cristãos poderia sentir-se complacente e satisfeito em seu isolacionismo das demais igrejas vizinhas; e cada denominação poderia realizar seu próprio programa de evangelização e de serviço social sem cogitar dos outros. Tudo isto estaria certo, se não fosse por uma cousa: Jesus Cristo quer que sua Igreja seja uma em mente, espírito, vida e testemunho." (p.6).

Estamos em 2009 e as mesmas questões apontadas pelo Rev. John Robert Nelson, há 45 anos continuam latentes: Será que há esperança para o ecumenismo?

Em 1986 outro metodista, o Professor Dr. Hélerson Bastos Rodrigues em No mesmo barco: vivência inter-eclesiástica dos Metodistas do Brasil De 1960 A 1971, assim introduz seu livro:" 'Se teu coração é como o meu coração'; se amas a Deus e a toda a humanidade, não peço mais: 'Dá-me a tua mão' ". Apoiando-se na Escritura (2 Reis 10.15) João Wesley, deflagrador do metodismo, pregou sobre "O Espírito Católico" [ou seja, universal], desenvolvendo uma argumentação que se encaminhou para conclusões da seguinte ordem:
... o homem de espírito católico é o que (...) ama — como amigos, como irmãos no Senhor, como membros de Cristo e filhos de Deus, como atuais co-participantes do presente reino de Deus e co-herdeiros de seu reino eterno — a todos, de qualquer opinião ou culto, ou congregação, que creiam no Senhor Jesus Cristo; que amem a Deus e aos homens; e que, regozijando-se em louvar a Deus e temendo causar-lhe ofensa, sejam cuidadosos no abster-se do mal e zelosos nas boas obras.
Espalhados pelas Igrejas que hoje atuam em dezenas de países, os sucessores de João Wesley souberam acolher aos conselhos de seu patrono. No Brasil, também, os metodistas não perderam o ideal da unidade que vem de Jesus Cristo.”

Não esqueçamos: o autor fala da de uma realidade do ano de 1986. Ao descrever o relacionamento da Igreja metodista brasileira com a Igreja Católica Helerson Bastos diz: "Nas 'celebrações em conjunto' programaram-se situações que contaram com católicos e protestantes, entre os quais os metodistas, que elaboraram e realizaram o evento conjuntamente. Tratam-se das Semanas de Oração pela Unidade Cristã, Semanas de Oração pela Pátria, celebração de ação de graças em datas nacionais, solenidades religiosas em formaturas escolares. (...)” (p.92)

Nas páginas conclusivas do livro Helerson Bastos afirma: “Os metodistas foram se conscientizando da necessidade de conhecer mais profundamente sua própria Igreja, suas raízes, sua identidade, sem o que não teriam como prosseguir maduramente no diálogo ecumênico.” Helerson Bastos encerra o livro com os seguintes dizeres sobre o ecumenismo:
“Realidade? Utopia!
Fé. . . esperança. . . amor. ..
Dá-me a tua mão. Estamos no mesmo barco.”

Desde a publicação de No mesmo barco passaram-se 23 anos e muitos/as metodistas nesse ano de 2009 repetem as mesmas indagações: Ecumenismo é realidade? Ou utopia?

Infelizmente o 18º concílio da Igreja Metodista do Brasil realizado em julho de 2006 decidiu sua retirada de todos os organismos e eventos onde a Igreja Católica participe. Assim distanciou seus membros do sonho de um ecumenismo pleno. Mas não “matou” a “utopia” dos corações ecumênicos. Muito pelo contrário, homens e mulheres comprometidos com o metodismo “histórico” encontram-se hoje ainda mais engajados/as como a causa ecumênica, por entender que ela é, não somente o fundamento da Igreja de Cristo, mas, o alicerce do Metodismo histórico formulado pelo pai da fé do metodismo mundial.

As palavras de Wesley, fundador do metodismo, ainda chama pela união das mãos e dos corações em unidade fraterna, refutando toda “unanimidade” perversa e excludente. “Na casa de nosso Pai/Mãe, que como galinha acolhe todos/as sob suas asas, há muitas moradas...” É essa compreensão que nutre o Movimento Metodista Confessante e demais metodistas ecumênicos espalhados/as pelo Brasil.

A cada Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos, nós, católicos e protestantes, temos oportunidade de testemunhar que: “Iluminados/as pela luz do Cristo que se fez homem e habitou entre nós”, temos a nítida convicção que “um novo mundo é possível”, mesmo e apesar das formulações equivocadas das lideranças “passageiras” que controlam o “poder” de nossas igrejas.

Assim na fé, na esperança e no amor podemos pedir: Dá-me tua mão; afinal estamos no mesmo barco.
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Movimento Metodista Confessante http://metodistaconfessante.blogspot.com/
Aprofunde a leitura
Um só Senhor, uma só Igreja
http://www.metodistavilaisabel.org.br/docs/Um_so_Senhor_uma_so_Igreja.pdf
No mesmo barco: vivência inter-eclesiástica dos Metodistas do Brasil De 1960 A 1971
http://www.metodistavilaisabel.org.br/docs/No_Mesmo_Barco.pdf