segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

A Teologia Cristã em Diálogo com a Espiritualidade Indígena

A Teologia Cristã em Diálogo com a Espiritualidade Indígena



Maria Renilda Tavares dos Santos e Isaías Lino Madureira


A espiritualidade indígena brasileira é tão diversificada que não haveria espaço aqui para descrevê-la. Dessa forma procuraremos abordar alguns elementos da espiritualidade da etnia dessana com qual temos familiaridade peculiar. Trata-se da família Veloso Vaz, proveniente da cabeceira do Rio Uaupés, no Alto Rio Negro, Município de São Gabriel da Cachoeira-AM, mais conhecida também como “Capital Indígena do Brasil”.



A família Veloso Vaz, movida pelo desejo e necessidade de desenvolvimento, migrou para as imediações de Manaus-AM, instalando-se na RDS Tupé, onde atualmente desenvolve um projeto de difusão cultural indígena através do qual encontra seu sustento.

A espiritualidade dessana traz em si uma carga cultural que representa um complexo sistema moral, ético e religioso, concentrado na figura do Pajé e manifesto na forma de danças e celebrações rituais com utilização de diversos instrumentos musicais considerados sagrados.

O senhor Raimundo Veloso Vaz é o Pajé da aldeia dessana na comunidade da RDS Tupé. Por meio de algumas entrevistas, tomamos ciência do impacto causado pelo encontro entre a teologia cristã e a espiritualidade indígena no contexto da etnia dessana.

Como líder espiritual de sua comunidade o senhor Raimundo, também conhecido como Pajé Kíssib Kumu, nos descreveu os efeitos negativos deste encontro da teologia cristã com a espiritualidade indígena que vai desde a proibição do uso de certos instrumentos musicais, considerados “amaldiçoados” por alguns “missionários cristãos”, até a negação total dos valores tradicionais indígenas.

De outro lado encontra-se o senhor Domingos Sávio Veloso Vaz, Cacique dessana da mesma comunidade. Em sua perspectiva, o encontro da teologia cristã com a espiritualidade indígena pode ser considerado “diálogo”, pois acredita que valores tradicionais dos brancos podem fortalecer, em determinadas áreas, o bem estar e a segurança dos povos indígenas no mundo moderno.

Sendo assim, temos um exemplo muito importante a considerar: membros de uma mesma etnia e família indígena podem sustentar pontos de vista diferentes no que diz respeito ao diálogo que se estabelece entre teologia cristã e espiritualidade indígena. Do ponto de vista do Pajé dessana o diálogo dificilmente se estabelece e produz bons resultados porque é inequivocamente unilateral em detrimento dos valores tradicionais indígenas.
Do ponto de vista do Cacique dessana, o diálogo pode e deve ser estabelecido já que valores institucionalizados como a educação, saúde, transporte e inclusão social são fundamentalmente valores constituintes da espiritualidade humana, pelos quais também lutou, sem medir esforços, um dos nossos mais proeminentes líderes cristãos: John Wesley.
Em fim, pode a teologia cristã dialogar com a espiritualidade indígena de modo produtivo? Sim, desde que esse diálogo ajude a recobrar a dignidade que os filhos e filhas de Deus possuem através do estabelecimento de verdadeiras relações de confiança mútua; restaurando o direito e a autonomia indígena sobre a terra através da criação e desenvolvimento de políticas públicas justas e promovendo a reconstrução de suas culturas e tradições como forma de reconhecimento e valorização da liberdade e identidade de cada povo e nação. O amor do Jesus Cristo bíblico e verdadeiro, que lhes foi prometido e negado no passado, precisa ser tornado conhecido por toda a nação indígena a fim de que tenham o direito de recebê-lo ou rejeitá-lo. Para tanto, a difusão das Escrituras cristãs na língua materna torna-se absolutamente necessária.



Em Cristo, não pode haver judeu nem grego; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos vós sois um em Cristo Jesus”.  (Gálatas 3.28).



Bibliografia

BIBLIA SAGRADA. Tradução em Língua Portuguesa por João Ferreira de Almeida. Revista e Atualizada no Brasil. 2ª ed. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 2006. 1248p.
CHAMORRO, Graciela; CAVALCANTE, Thiago Leandro. Fronteiras e Identidades: encontros e desencontros entre povos indígenas e missões religiosas. Nhanduti, São Bernardo do Campo: 2011. 352p.
COLÉGIO EPISCOPAL, Igreja Metodista, Diretrizes Pastorais para a Ação Missionária Indigenista. São Paulo: Cedro, 1999. 28p. (Biblioteca Vida e Missão, 9)
GALVÃO, Raimundo Castro; GALVÃO,   Wenceslau Sampaio.  Livro dos Antigos Desana -  Guahari Diputiro Porã. São Gabriel da Cachoeira: Instituto Socioambiental, 2004. 690p. (Narradores Indígenas do Rio Negro, 7)
LANGER, Protásio Paulo; CHAMORRO, Graciela; Missões, Militância Indigenista e Protagonismo Indígena. Nhanduti, São Bernardo do Campo: 2012. 368p.
VAZ, Domingos Sávio Veloso. Série de entrevistas concedidas ao Projeto Luz e Vida: Missão Amazônia. Manaus, Janeiro e Julho 2012; Janeiro 2013.
VAZ, Raimundo Veloso. Série de entrevistas concedidas ao Projeto Luz e Vida: Missão Amazônia. Manaus, Janeiro e Julho 2012; Janeiro 2013.
WRIGHT, Christopher J. H. A Missão do Povo de Deus: uma teologia bíblica da missão da igreja. Vida Nova, São Paulo: 2012. 352p.


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Estudos de Teologia Contemporânea.
Alunos: Maria Renilda Tavares dos SantosIgreja Metodista Central em Manaus-AM e Isaías Lino Madureira, Igreja Evangélica Cristo é Vitória, Ermelino Matarazzo-SP.
Curso Bacharel em Teologia - 6º período - matutino
Acompanha apresentação vídeo disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=YOZEYVW6L2o

Publicado originalmente em: http://projetoluzevidamissaoamazonia.blogspot.com.br/2013/11/a-teologia-crista-em-dialogo-com.html

Um comentário:

Projeto Luz e Vida: Missão Amazônia disse...
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