Adesão ou conversão?
Carlos Wesley*
Carlos Wesley*
“Não podemos admitir que o nosso crescimento numérico seja constituído de um aglomerado de pessoas, sem conhecimento e preparo bíblico-doutrinário, sem comprometimento com as raízes históricas do metodismo e as posições assumidas historicamente pela Igreja, através de seus concílios e seus documentos, tornando-se um ajuntamento de pessoas que estão na Igreja Metodista mas não vestem a camisa da identidade metodista, afirmando: “Estou na Igreja Metodista” ao invés de dizerem: Sou Metodista”.
Essa é uma afirmação do falecido Bispo David Ponciano Dias, em sua Palavra Episcopal publicada no Expositor Cristão de outubro de 1999 e agora, também, a preocupação do Bispo Paulo Lockmann, de nossa Região, que em seu relatório episcopal ao XXXV Concílio Regional realizado recentemente, afirmou a existência, em nosso meio, de “uma desordem religiosa”, onde “as fronteiras religiosas se confundem e confundem”. Disse ainda o Bispo Lockmann: “Vive-se uma conturbação religiosa, na qual, nós, metodistas, somos visivelmente afetados (as). Dentro desse quadro, as pessoas são, em grande número, levadas por todo o vento de doutrina, agitadas de um lado para outro”.
As afirmativas dessas duas importantes lideranças refletem a angústia de uma parte considerável e respeitável de nossa Igreja Metodista, diante de uma acelerada perda de identidade de nossa denominação face, principalmente, à perturbadora influência dos grupos neo-pentecostais, cada vez mais presente nas igrejas protestantes (caracterizando os grupos históricos das igrejas chamadas evangélicas, estas hoje constituindo um arco bastante heterogêneo de componentes, muitas vezes divergentes entre si), impregnando-as de doutrinas, costumes e práticas que nada têm a haver com elas.
O crescimento numérico dessas novas seitas tem sido invejado em nosso meio, principalmente quando artistas conhecidos e esportistas famosos, para não falar de bandidos notórios, se dizem convertidos e freqüentam alguns desses movimentos, fazendo com que muitos pastores nossos busquem em seus arraiais os modelos do seu ministério pastoral. Afinal de contas, tem contado muito na avaliação do seu trabalho ministerial (não usei a expressão “trabalho pastoral” intencionalmente) o crescimento numérico de sua comunidade, seja ele conseguido a que preço for. Chego a pensar, mesmo, que, nessa questão, muitos têm agido como se os fins justificassem os meios...
Essa reflexão está sendo feita em razão de um artigo publicado na revista Ultimato (setembro/outubro de 2001), intitulado “Monique Evans ainda está longe da terra prometida”. O título pode até soar estranho para alguns, ou mesmo parecer um julgamento pesado, mas não é. O tema desenvolvido ali defende a tese de que “nesta época de euforia e de ênfase à conversão de celebridades e de multidões, a igreja evangélica brasileira precisa redescobrir o significado da palavra “conversão”“. É um texto muito mais elucidativo que condenatório.
O que significa conversão para nós? Eu ainda peguei um tempo onde ser “crente” implicava em muitas perseguições, inclusive na própria família (meu pai foi pastor na década de trinta no interior capixaba e mineiro), além de preconceitos, chacotas, humilhações, entre outras coisas. Dentre tantas histórias da bela carreira pastoral do meu pai, existem algumas de perseguições a pedradas pelas ruas de cidade interioranas. Muitos irmãos antigos de nossas comunidades metodistas podem contar histórias semelhantes que nunca imaginaríamos que pudessem um dia ter acontecido.
Mas, o tempo é outro. A Igreja Evangélica ocupa hoje um lugar de proeminência na sociedade. Seu crescimento vertiginoso chama a atenção da mídia e, conseqüentemente, da população em geral. Para dizer a verdade, ser crente hoje até dá um certo status. Nos bancos, ou nos púlpitos das igrejas, estão assentadas pessoas importantes, astros e estrelas da TV, personalidades do mundo esportivo, músicos do show business e até notórios bandidos que se “converteram”, como aquele bem conhecido ladrão de carros que, depois, foi morto na disputa por uma “boca de fumo” numa favela de nossa cidade... A própria igreja hoje fabrica os seus ícones, sendo que um, dos mais famosos, encontra-se hoje no ostracismo pelos problemas de adultério e de envolvimento com dossiês falsificados. E nesse entorpecimento da fama, gerado pela ação midiática, muitos são atraídos para as fileiras das igrejas. Como foi muito bem colocado pela Ultimato, “é preciso fazer a diferença entre adesão e conversão. Adesão é o ato de abraçar um movimento... Conversão é um acontecimento que imprime novos conceitos e nova vida”.
Conversão, segundo D.G. Bloesch, “é a invasão da graça divina na vida humana, a ressurreição da morte espiritual para a vida eterna”. Quem inicia a obra da conversão é o próprio Deus, nunca o homem. Assim, a conversão só pode ser entendida como uma resposta humana a um chamado divino. Não é o homem quem decide aceitar Jesus como seu Senhor. Ele na verdade está simplesmente respondendo à graça irresistível de Deus.
A conversão possui dois aspectos distintos que precisam ser levados em consideração nesses tempos de tanta confusão. Esses elementos são o arrependimento e a fé. A verdadeira conversão vem atrelada a essa dupla inseparável. Enquanto o arrependimento é o ato de se dar as costas para o pecado, a fé é o ato de se voltar para Cristo. O arrependimento significa a mudança que é produzida na vida daquele que se encontra com Jesus, levando-o ao abandono do pecado. A fé é o ato de se apossar das promessas e da obra de Cristo. Na genuína conversão, um jamais existe sem o outro.
O que temos visto, porém, é muita “conversão” e pouca manifestação de arrependimento e fé. A conversão sem o reflexo desses dois elementos produz um cristianismo espúrio.
O Bispo David, depois da sua afirmação citada no início desta reflexão, complementa: “Desta maneira, o crescimento numérico mais se parece com uma inchação do que com um crescimento saudável que é necessário para o desenvolvimento da ação missionária da igreja”. Valdir Steuernagel, disse que “uma igreja que cresce e que não tem impactos de justiça na sociedade sofre de um crescimento enfermo”.
É, ainda, do Bispo Paulo Lockmann, em seu documento ao povo chamado Metodista da Primeira Região, por ocasião do Concílio Regional, a afirmação de que é vital definir a razão de nossa existência: “É importante deixar claro quem somos e para quê existimos. E tal definição deve ser, acima de tudo, conhecida da comunidade interna. Todos (as) os (as) metodistas precisam saber e memorizar essa lição.”
João Wesley dizia que o povo metodista existe “para transformar a nação, particularmente a Igreja e espalhar a santidade bíblica por toda a terra”. A Igreja Metodista precisa crescer, sim, mas em unidade e com identidade, através de verdadeiras conversões e não de festivas (ou interesseiras) adesões, como a de Constantino e seu exército, para poder causar impacto na sociedade, provocar mudanças e participar do “seu propósito de salvar o mundo”. Digamos todos: AMÉM!
IGREJA METODISTA:
Crescimento em Unidade e com Identidade
METODISTA: Ler ou não Ser
Pela preservação e valorização da Identidade Metodista
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