Metodistas brasileiros participam da Assembleia do Conselho Mundial de Igrejas - Relato de Alexandre Pupo Quintino (membro da IM em Vila Mariana - SP)
Deus da Vida guia-nos à Justiça e à Paz.
A cada 7 anos o Conselho Mundial
de Igrejas se reúne em Assembleia em algum canto dessa nossa terra habitável.
Mais do que uma reunião administrativa ou um concílio de diversas denominações,
as Assembleias são momentos de celebração, reflexão e desafio para todos que
ali estão reunidos. A comunidade do CMI é formada por 345 igrejas, de mais de
110 países que somam um total de cerca de 500 milhões de cristãos de todo o
mundo. São igrejas de tradição Ortodoxa, Anglicana, Reformada, Unida,
Metodista, Pentecostal, Copta, entre outras. Além das igrejas membro, uma série
de igrejas participam do conselho como observadoras, como a Igreja Católica
Romana, ao lado de inúmeras organizações ecumênicas internacionais, como a
Christian Aid e WSCF. Criado formalmente em 1948 o Conselho tem como meta a
dedicação e o esforço para a unidade e a reconciliação das igrejas cristãs, o
testemunho profético de justiça e paz, e o diálogo inter-religioso para o
respeito e resolução de conflitos.
As celebrações das Assembleias
ocorrem dentro de tendas para que nos lembremos de que somos um povo em
movimento, uma caminhada ecumênica. Deste modo, desde a última Assembleia em
Porto Alegre, 2006, o movimento ecumênico se colocou em peregrinação rumo à
Coreia. Deus da Vida, guia-nos à Justiça e à Paz, foi o tema escolhido para a
caminhada. A península coreana é marcada pela divisão formal desde a Guerra
Fria, uma guerra que não terminou oficialmente, e um incrível crescimento do
cristianismo nessas terras. Estes foram temas que motivaram tanto a preparação
quanto as discussões temáticas e plenárias deste encontro. Um trem chamado
“Peace Train” saiu desde Berlim, cidade que também foi historicamente dividida,
em direção a Coreia. Nele, cristãos de diversos países e denominações
participaram de diversos encontros e atividades que levavam uma mensagem de paz
e reconciliação, enquanto viajavam de Berlim, à Rússia, à Pequim, à Seul e,
enfim, Busan.
A Assembleia foi iniciada com um
momento de oração e celebração com mais de 5.000 pessoas. Aos três toques de um
grande gongo coreano, nos lembrando da trindade, se deu inicio a celebração. Um
grande coral e uma orquestra que contava com instrumentos tradicionais coreanos
foram conduzidos com maestria pelo Professor Tercio Junker, metodista
brasileiro. Era a celebração do Deus da Vida que nos reúne como seu povo para o
testemunho da justiça e da paz. A prédica foi feita pela sua Santidade Karekin
II, Catholicos de todos os Armênios, da Igreja Apostólica Armênia. Em sua
mensagem, ele nos lembro dos desafios deste chamado de testemunho e conclamou a
comunidade cristã à uma resposta pelos 100 anos do Genocídio Armênio, ainda
hoje não reconhecido pelos seus perpetradores.
Ao longo dos 10 dias de reunião
os participantes se reuniam em diferentes momentos de reflexão e partilha. O
dia se iniciava com um momento cúltico, seguido de estudos bíblicos nas
diferentes línguas. Iniciavam-se, então, as sessões plenárias temáticas, que
traziam diversas formas de expressão de música, dança, imagens, entre discursos
de personalidades convidadas à discutirem sobre o tema proposto. O continente
asiático, a missão da igreja, Paz, Justiça e Unidade, foram temas explorados
nestas sessões que contaram com a participação dos Irmãos da Comunidade
Ecumênica de Taizé, do Arcebispo da Cantuária (sé da Igreja Anglicana) e o
Cardeal Koch trazendo uma mensagem do Papa Francisco, entre outros.
Nestas sessões assuntos
importantes foram trazidos e desafiavam os participantes. O embargo ao Irã,
trazido pela perspectiva de uma cristã armênia local, os desafios dos cristãos
na triste história da Libéria, a superação do Apartheid na Africa do Sul, os
dramas da imigração, a vergonha do desentendimento teológico que não permite
que até hoje cristãos de diferentes denominações não possam celebrar a Ceia do Senhor
ao redor da mesma mesa.
Durante a tarde ocorriam diversos
Workshops de programas do Conselho e de organizações parceiras, como o Programa
Ecumênico de Acompanhamento na Palestina e Israel, EAPPI, programa que há 10
anos trabalha para a resolução do conflito na Terra Santa na perspectiva da paz
justa. Também havia uma série organizações com stands montados no Madang,
palavra coreana que significa “espaço de encontro” “jardim”, área reservada
para exposição e partilha de iniciativas ecumênicas. Nele estavam presentes exposições
de arte, como a exposição de “cruzes de todo o mundo”, organizada por uma
Igreja Metodista de Seul, instalações com fotografias, espaços de organizações,
como a Organização Mundial de Mulheres no Ministério, Kairos Palestine e diversos
trabalhos de igrejas coreanas, espaços de oração e intercessão por problemas
mundiais e um espaço de diálogo inter-religioso.
Reuniam-se a tarde também as
sessões administrativas. Aprovavam-se os relatórios das diferentes comissões,
como a Comissão de Diálogo com as Igrejas Pentecostais, Comissão de Povos
Indígenas e Comissão de Assuntos Internacionais, e se traçavam as diretrizes do
Conselho para os próximos 8 anos. Ocorreu também a eleição dos novos
presidentes e do novo comitê central do CMI. Foram eleitos os oito presidentes,
sendo 4 mulheres 4 homens. O CMI possuí uma política de representatividade que
visa equilibrar a escolha de jovens, homens, mulheres, clérigos, leigos e
ortodoxos nas comissões. Entretanto, devido às delegações enviadas pelas
igrejas-membro, não foi possível atender às diretrizes de
representatividade. 61% de homens, 39%
mulheres, 32% leigos, 68% clérigos, 13% jovens, 5% indígenas, 2% portadores de
deficiência. Essa representação ensejou discussão principalmente por parte dos
jovens, que deveriam ter 25% de presença. É indispensável para a vitalidade do
movimento ecumênico a participação de jovens, mas que para isso se torne
possível é necessário que as igrejas enviem mais leigos e jovens como
delegados, assim como mais mulheres.
Após as sessões administrativas
diferentes confissões religiões eram responsáveis por cada uma das orações
vespertinas, segundo às suas tradições. Coptas, ortodoxos, anglicanos e
pentecostais alimentaram nossa espiritualidade com sua diversidade de estilos,
sons e símbolos. É importante marcar a presença dos Pentecostais na Assembleia.
A maior igreja pentecostal da Coreia apoiou a realização deste encontro na
Coreia e foi a responsável por uma das orações noturnas. Trata-se da Igreja do
Evangelho Pleno de Yeodo, Seul, que conta com uma membresia de 830.000 membros.
Entretanto, durante todos os dias, manifestantes de diversas denominações protestantes
conservadoras da Coreia faziam manifestações do lado de fora do centro de
convenções Bexco, onde nos encontravam. Tais protestos foram motivo de
discussão também dentro da Assembleia, onde discutíamos como responde-los e
chama-los para o diálogo. No último dia as manifestações ultrapassaram o limite
da não violência e um dos manifestantes invadiu o local de culto, correu até o
altar atirou três ovos, empurrou a pastora que fazia uma oração e gritou
palavras de ordem antes de ser interceptado pela segurança. Esse episódio
encontra-se dentro de um contexto muito específico da sociedade coreana,
especialmente a igreja, fortemente divididas em torno de assuntos políticos,
econômicos e sociais da sociedade coreana. A igreja coreana conta com dois
Conselhos Nacionais de Igrejas diferentes, sendo que só um apoiou a realização
da Assembleia. Deste modo, oramos também pela união interna da igreja dentro da
Coréia.
Pessoalmente, a minha
participação na Assembleia se deu através do trabalho dos Stewards. Os Stewards
são 120 jovens do mundo todo que participam como voluntários e estagiários em
áreas importantes para a realização desta. Particularmente, eu participei da
comissão de liturgia e música, na qual tive a oportunidade de ajudar na
organização e montagem da liturgia, participação nas orações, momentos
litúrgicos, produção dos símbolos e na área musical. O programa de Stewards é
uma oportunidade única de aprender com mestres que atuam nestas áreas e
compreender, de dentro, como funciona o Conselho Mundial de Igrejas e uma
Assembleia deste porte. O contato com jovens de diferentes tradições cristãs,
contextos culturais, línguas e regiões do mundo é muito enriquecedor, nos ajuda
a perceber a grandeza e profundidade do conceito de Fé, Justiça, Paz, Igreja e
até do nosso próprio Deus. Tive a oportunidade de compartilhar um pouco do
trabalho realizado pela REJU, Rede Ecumênica da Juventude, organização de que
faço parte. Nossos trabalhos com a situação da violência urbana e da
desigualdade social, a questão de eco-justiça e da luta contra a intolerância
religiosa. Volto com ideias e compromissos firmados através destes contatos,
partilhas, reflexões e orações. O ecumenismo é um imperativo cristão. El é
essencialmente local, leigo e jovem, deve acontecer na base, anunciando de
forma profética o Reino da Vida naqueles contextos onde há separação.
Fotos retiradas de: http://sacrariopessoal.wordpress.com/
Um comentário:
Alexandre, obrigado pelo seu relato testemunho. Já fui em duas assembleias do Conselho e de fato é uma experiencia impar. Energias boas e seguimos juntos neste barco e nesta jornada ecumenica ... Paulo Ueti.
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